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Entrevista-Maisfutebol: Ricardo Ribas estreia-se nos Jogos Olímpicos acompanhado de uma história de vida fortíssima. No dia da Maratona, a aldeia de Malhadas estará consigo

09 Agosto 2016

Coração inquieto, alma de conquistador, veias de sangue transmontano. Ricardo Ribas, nado e criado na pitoresca aldeia de Malhadas, Miranda do Douro. Salteador de sonhos, homem da Maratona. Olímpica, pois claro.

Ricardo fugiu de casa para correr. Desapareceu cinco dias. Onde anda o Carlos Lopes de Malhadas? Ninguém soube, ninguém sabia. Mas Ricardo nunca foi doido, a não ser pelo atletismo. Partiu para Paço de Arcos, poupanças nos bolsos e ambição na mente: ’Quero vingar nas corridas, quero imitar o meu ídolo Carlos’.

«Tinha 17 anos e desapareci. Cinco dias, é verdade. Fui de Trás os Montes para Lisboa. Andei no Campo Grande a arrumar carros. Depois lá ganhei algum juízo e fui trabalhar para um restaurante. Servia às mesas. Foi lá que conheci um grupo de pessoas que corria e juntei-me a eles. Nunca mais saí. O atletismo salvou-me».

Ricardo treinou, treinou e começou a ser recompensado em 2000. Foi contratado pelo Maratona Clube de Portugal, sem receber ordenado. «Pagavam-me o material desportivo e pouco mais», conta ao Maisfutebol.

Mais tarde, já com estatuto de profissional, passou a ganhar 250 euros mensais. Criou um alter-ego para as obrigações diárias no mundo da restauração e à noite baixava a máscara. Ali sim, Ricardo Ribas podia ser quem queria ser.

Ricardo Ribas a representar Portugal

«Tive esta ideia desde que me lembro de ser gente», continua o atleta, presença portuguesa no Rio2016. «Comecei a ver atletismo na televisão, com sete/oito anos, fixei-me nos meus ídolos. Passei a cronometrar as minhas corridas e escrevia em folhas de papel os tempos que fazia».

Todos em Malhadas conheciam o pequeno Ricardo. Quando viam poeira levantada, sabiam que o filho do senhor Ribas acabara de passar. A correr, claro.

«Chamavam-me Carlos Lopes. Nunca quis jogar futebol como os outros, adorava correr. Mais tarde entrei nas provas do desporto escolar e depois levei as coisas mais a sério em Bragança. Com 13/14 anos só pensava em atletismo e os estudos ficaram para trás», revela Ricardo Ribas.

O idealismo é muito bonito, mas a família não achou piada. Nenhuma. «Os meus pais queriam o melhor para mim. Tenho uma irmã enfermeira, outra também com estudos, mas eu só queria atletismo».

«Só tenho de lhes pedir desculpa. Aos meus pais e às minhas irmãs», refere em tom pungente, de desagravo, a décadas de distância dos eventos. «Fui para Lisboa atrás deste meu sonho, que para eles era só uma maluqueira. Imagino o terror que eles sentiram ao não saber de mim».

Dia 21 de agosto, no Rio de Janeiro, a aldeia de Malhadas volta a trajar-se de orgulho e comoção. Pelo filho da terra, o Carlos Lopes transmontano.

http://www.maisfutebol.iol.pt/entrevista/ricardo-ribas/rio2016-arrumei-carros-e-servi-a-mesa-o-atletismo-salvou-me